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sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

SÍNTESE JURÍDICA DA PRÁTICA CONHECIDA COMO “RACHADINHA”


SÍNTESE JURÍDICA DA PRÁTICA CONHECIDA COMO “RACHADINHA”

Por Ariana Anari Gil

"É o escárnio à decência, às regras de conduta, à Lei, ao próprio ordenamento jurídico e à coletividade.” Pedro Manoel Abreu Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.


                   O termo “rachadinha”, tem tomado os meios de comunicação e mídias sociais de nosso país, como “nova” forma de combate à corrupção, situação que merece análise e reflexão dos cidadãos, vez que, algo tão grave, pasmem, está sendo tratado por “alguns” cidadãos e políticos investigados pela prática, como algo banal, sem importância, corriqueira. 

                        A prática conhecida vulgarmente como “rachadinha”, é ação praticada geralmente por parlamentares federais, estaduais e municipais, que acordam ou exigem mediante permanência de emprego, repasse de parte dos salários de funcionários que nomeiam para seus gabinetes, caracterizando vantagem indevida em razão da função, porém, os julgados nos mostram várias teses em torno da modalidade criminosa que representa, vejamos:

                         Primeiramente é preciso entender o conceito da prática conhecida como “rachadinha” segundo Pedro Arruda, cientista político e professor da PUC – SP, a “rachadinha” é:

“a rachadinha é caracterizada pela transferência de salários de assessores para o parlamentar ou secretário a partir de um acordo pré-estabelecido ou como exigência para a função, a rachadinha pode ou não envolver a contratação de funcionários fantasmas. O esquema envolve repasses de quantias menores quando comparadas a grandes casos de corrupção – por movimentar valores na faixa dos milhares e não milhões, isso se reflete no perfil político que comete a prática. É uma prática típica de parlamentares de baixo clero e políticos provincianos, como vereadores nas câmaras municipais e funcionários de baixo escalão”[1]

                        Para Vera Chemim constitucionalista e mestre em direito público administrativo, pela FGV, a “rachadinha” é” 

“rachadinha” “é uma divisão de proventos, de alguma vantagem financeira, por deliberação de um agente público"

                         Marilda Silveira, professora de direito administrativo da Escola de Direito do Brasil, a "rachadinha":

“pode ocorrer de maneiras diversas. "Uma forma bastante comum é se aproveitar de alguém que está desesperado para conseguir um emprego e fazer com que o funcionário divida o dinheiro de sua remuneração", diz. "O combinado pode ser, por exemplo, enviar uma fatia do dinheiro para a irmã do político", afirma Silveira.[2]

                        Contudo embora haja um conceito pré-definido, considerando a prática da “rachadinha” como recebimento de vantagem ilícita devido à função pública ocupada, que pode ocorrer de diversas formas, inclusive acordada ou sob “ameaça” da perda de emprego, nossos juristas e julgados, não tem apresentado teses e fundamentação uníssona sobre o tema que tem invadido o cotidiano dos brasileiros, vejamos:

                        Alguns juristas e julgado tipificam a prática da “rachadinha” como crime de peculato (julgado abaixo), que segundo o dicionário Houaiss consiste “na subtração ou desvio, por abuso de confiança, de dinheiro público ou de coisa móvel apreciável, para proveito próprio ou alheio, por funcionário público que os administra ou guarda”                       

                        E assim entendeu o Juiz de Direito Dr. Gustavo Nardi da Comarca de Monte Mor do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ao sentenciar o processo 1000523-19.2018.8.26.0372, que na situação fática apurou o repasse de valores recebidos por funcionários à vereadora:

“Ante o retro exposto e todo o mais que consta dos autos, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva veiculada na denúncia para CONDENAR os acusados.........como incursa, por nove vezes, no artigo 313, em continuidade delitiva prevista no artigo 71,caput, e no artigo 158, §1º, todos do Código Penal e ................., como incurso, por nove vezes, no artigo 313, em continuidade delitiva, prevista no artigo 71,caput, e no artigo 158 §1º, ambos c/c artigo 29, caput, todos do Código Penal, cada um à pena de 06 (seis) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 28 (vinte e oito)dias multa, no patamar mínimo, em regime inicial semiaberto, além da perda do cargo, função pública ou mandato eletivo, bem como para CONDENAR,................... qualificada nos autos, como incursa, por nove vezes, no artigo 313 c/c artigo 29 caput, em continuidade delitiva prevista no artigo 71 caput, todos do Código Penal à pena de 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão, mais 15 (quinze) dias-multa, no patamar mínimo, em regime inicial aberto. DATA 17/12/2019 [3]

                        Que, há o entendimento que a prática da “rachadinha”, caracteriza o crime de estelionato, inclusive associado à organização criminosa como entendeu a Juíza de Direito Dra. Ana Paula Achoa Mezher, ao sentenciar o Processo de n. 0009511-15.2016.8.26.0405, município de Osasco do Tribunal de Justiça de São Paulo:

 “CONDENO o acusado..., qualificado nos autos, como incurso nos artigos 2º, §§ 3º e 4º, inciso II, da Lei n.º12.850/13; art. 171, caput, por 40 (quarenta) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art. 171, caput, por 45 (quarenta e cinco) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva),ambos do Código Penal; art. 171, caput, por 44 (quarenta e quatro) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art. 171, caput, por 45 (quarenta e cinco) vezes,c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art. 171, caput, por 32 (trinta e duas)vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art. 171, caput, por 38 (trinta e oito) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art. 171, caput, por 32 (trinta e duas) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art. 171, caput,  por 30 (trinta) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art. 171, caput,por 45 (quarenta e cinco) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art.171, caput, por 43 (quarenta e três) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; art. 171, caput, por 18 (dezoito) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código  Penal; art. 171, caput, por 12 (doze) vezes, c/c art. 71 (continuidade delitiva), ambos do Código Penal; todos na forma do art. 69, caput, do Código Penal, às penas de 7 anos, 9 meses e 15 dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e, pagamento de 34 dias-multa, fixada em 1/6 do salário mínimo...”

                         Que para alguns juristas e julgado, a prática da “rachadinha” nos órgãos públicos, é tipificada como crime de concussão (exemplo de julgado abaixo) que é obtenção de vantagem indevida em razão da função tipificado no artigo 316 do Código Penal, como entendeu o v.acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo Processo n. 1002546-56.2018.8.26.0462 do Município de Poá.

“...Isto porque, ainda que o repasse, em um total de R$12.000,00 (doze mil reais), tenha se estendido por doze meses, ocorrendo, portanto, parceladamente, com o pagamento de R$1.000,00 (mil reais) em espécie, por mês, de Jorge a Domingos, o crime de concussão é de natureza formal, consumando-se com a exigência da vantagem indevida, sendo o recebimento desta mero exaurimento da conduta... Desta forma, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, para, afastando o crime continuado, alterar a pena imposta ao apelante.................para 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e pagamento de 20 (vinte) dias-multa, calculados à razão de 1/10(um décimo) do salário mínimo, passando a estar incurso no art. 316,caput, c/c art. 92, inciso I, alínea “a”, ambos do Código Penal, mantida, no mais, a respeitável sentença de primeiro grau”[4]

                       Que, para alguns juristas e julgado, a prática da “rachadinha”, em tese representa improbidade administrativa que importa enriquecimento ilícito e/ou prejuízo ao erário público, em que a exigência de repasse de parte de salário de assessores, configura ato improbo, em conformidade com a Lei 8.429/1992, que é a Lei de Improbidade Administrativa.

                        Abaixo Jurisprudências, que considerando a prática da “rachadinha” como improbidade administrativa:

Ação civil de promoção de responsabilidade por improbidade administrativa. Processo conduzido em ambiente de ampla liberdade probatória conferida ao réu. Indeferimento de nova oportunidade para oitiva de testemunha bem justificado nos termos do parágrafo único do art. 370 do CPC. Inexistência de cerceamento de defesa. Vereador. Apropriação de parcela dos vencimentos de servidora comissionada. "Rachadinha". Prática ilícita (grifo nosso) que não se justifica na alegação de empréstimo pessoal não formalizado, exigível em contexto de relações funcionais informadas pela moralidade e pela probidade administrativas. Inexistência de excepcionais relações pessoais que autorizassem contrato verbal. Prisão em flagrante e condenação criminal transitada em julgado. Ilícito bem reconhecido. Penas fixadas com moderação. Observação: acréscimo patrimonial ilícito ora circunscrito à parcela de três remunerações mensais da servidora. Sentença de procedência mantida. Recurso improvido, com observação. (TJSP;  Apelação Cível 1005195-54.2016.8.26.0400; Relator (a): Luis Fernando Camargo de Barros Vidal; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Público; Foro de Olímpia - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/08/2019; Data de Registro: 15/08/2019).

APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – Improbidade Administrativa – Exigência indevida de parcela dos salários de funcionárias comissionadas em troca de manutenção no cargo ocupado (grifo nosso) – Sentença de procedência – Decisão que merece ser mantida – Inexistência de cerceamento de defesa – Oportunidade de se manifestar posteriormente à juntada dos documentos apontados – Inexistência de vício apto a macular a decisão – No mérito, as provas dos autos se mostram bastantes a justificar a sanção aplicada pelo juízo a quo – Depoimentos das testemunhas que apresentam coerência interna e se complementam – Além de estarem em consonância com as provas documentais, que, embora isoladamente insuficientes, corroboram as alegações trazidas pelas testemunhas – Extratos das contas bancárias das autoras que demonstram saques de quantias compatíveis com a forma de repasse dos valores alegada pelas servidoras – Provas indiciárias que se mostraram, no caso em tela, bastantes para a caracterização da conduta ímproba - Precedentes desta Corte - Recurso desprovido. (TJSP;  Apelação Cível 0006532-80.2014.8.26.0363; Relator (a): Rubens Rihl; Órgão Julgador: 13ª Câmara Extraordinária de Direito Público; Foro de Mogi Mirim - 2ª Vara; Data do Julgamento: 03/12/2017; Data de Registro: 05/12/2017).

                        Que, outros juristas tipificam em suas teses a prática da “rachadinha” como o delito de corrupção passiva, que é quando o servidor solicita, para si ou para terceiros, uma vantagem indevida, consubstanciado no artigo 317 do Código Penal:

 CORRUPÇÃO PASSIVA
 Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.         (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)
§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
 § 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

                        Que, não menos importante observarmos as decisões de outros Tribunais de Justiça, referente à prática da “rachadinha” em Minas Gerais vereadores foram condenados. Na situação fática, apurou-se que valores foram destinados à mulher de um dos vereadores:

“Os valores descontados eram destinados à mulher de Ailton, Marilene Cristina, que prestava serviço voluntário. Ela também foi condenada a um ano de detenção e cinco meses de em regime aberto. Por ser primária e ter confessado, sua pena foi transformada em prestação de serviços à comunidade e pagamento de um salário mínimo a uma instituição assistencial.”[5]

            Que, em Santa Catarina o vereador que exigiu parte do salário de seus assessores foi condenado por improbidade:

“A pena aplicada por unanimidade pela Primeira Câmara de Direito Público do TJSC foi de multa de 20 vezes os valores recebidos em vista da divisão do salário do assessor, suspensão dos direitos políticos por três anos e proibição de contratar com o poder público pelo mesmo prazo. A decisão é passível de recurso. (ACP n. 0002305-73.2012.8.24.0007).”[6]

            Que, além dos julgados, cidadãos e juristas precisam atentar-se aos casos que tem ganhado repercussão de mídia, de políticos envolvidos na prática conhecida vulgarmente como “rachadinha”, o mais recente é o do ex-vereador e animador de TV Marco Antonio Ricciardelli, o Marquito, o caso está sendo investigado desde o ano de 2016, e envolve 45 pessoas, sendo que no mês de Novembro do ano de 2019, o juiz do Departamento de Inquéritos Policiais (Dipo) Fabio Pando de Matos decretou a quebra de sigilo bancário do período de 12 de janeiro de 2013 a 31 de março de 2016.[7]

            Destarte o caso de destaque que obteve notoriedade e atenção da prática da “rachadinha”, foi consequência da chamada Operação Furna da Onça, conduzida pela Polícia Federal para investigar corrupção na Assembleia Legislativa do estado do Rio de Janeiro (Alerj), que envolveu o nome de Flavio Bolsonaro.[8]

            Como se vê, atualmente o consenso é que a prática conhecida como “rachadinha”, é ilegal e imoral, porém, os julgados e jurisprudências nos mostram, que a tipificação da conduta irá depender de como a situação fática aconteceu, sem desmerecer a gravidade da prática, vez que, na maioria dos julgados, os nobres julgadores são enfáticos em afirmar que tal conduta é odiosa vinda de um representante do povo, que no mínimo afronta os princípios da Administração Pública elencados no artigo 37 da Constituição Federal, como bem salientou o Desembargador-relator do Tribunal de Justiça de Santa Catarina Dr. Pedro Manoel Abreu, que em seu voto ao julgar recurso da Ação Civil Pública n. 0002305-73.2012.8.24.0007  destacou que:

“... é certo que configura afronta aos princípios da Administração Pública da legalidade e da moralidade, enquadrando-se no art. 11º da mesma norma legal. "É o escárnio à decência, às regras de conduta, à Lei, ao próprio ordenamento jurídico e à coletividade", considerou”

            Assim, é importantíssimo lembrarmos que os representantes do povo, ocupam cargo que requer extrema responsabilidade e comprometimento, com a coletividade, e a prática da “rachadinha” é situação gravíssima para um representante do povo, que ao comete-la demonstra não estar à altura para desempenhar o cargo que foi eleito, é inadmissível, um representante do povo se valer de seu cargo para obter vantagens em seus “negócios” particulares. 
            No mais importante destacar que, a tese de que o salário pertence ao funcionário, é privado, e não público, e ele pode fazer o que quiser com a verba, não é acatada por nossos tribunais, vez que, a prática, no mínimo, afronta o princípio da moralidade administrativa, e, caracteriza ato improbo, ou seja, IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, além de que, não acredite na falácia que a “rachadinha” só acontece quando o valor do repasse é depositado na própria conta do político, como visto nas decisões judiciais acima o repasse de valores acontece de várias formas.

            DENUNCIE A “RACHADINHA” 


 


[1] https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/09/13/O-que-%C3%A9-a-rachadinha.-E-como-ela-aparece-na-pol%C3%ADtica-hoje
[2] https://www.bbc.com/portuguese/brasil-50842595
[3]http://esaj.tjsp.jus.br/cjpg/pesquisar.do;jsessionid=0EC5D976E8B7CD37A41C34BE5FBC4E1F.cjpg1?conversationId=&dadosConsulta.pesquisaLivre=repasse+de+parte+do+sal%C3%A1rio+assessor&tipoNumero=UNIFICADO&numeroDigitoAnoUnificado=&foroNumeroUnificado=&dadosConsulta.nuProcesso=&dadosConsulta.nuProcessoAntigo=&classeTreeSelection.values=&classeTreeSelection.text=&assuntoTreeSelection.values=&assuntoTreeSelection.text=&agenteSelectedEntitiesList=&contadoragente=0&contadorMaioragente=0&cdAgente=&nmAgente=&dadosConsulta.dtInicio=&dadosConsulta.dtFim=&varasTreeSelection.values=&varasTreeSelection.text=&dadosConsulta.ordenacao=DESC
[4]https://esaj.tjsp.jus.br/cposg/show.do?processo.codigo=RI004W5CT0000&processo.foro=990&processo.numero=10025465620188260462&gateway=true#
[6] https://mpsc.mp.br/noticias/vereador-que-exigia-parte-de-salario-de-assessor-e-condenado-por-improbidade
[7] https://noticias.r7.com/sao-paulo/justica-quebra-sigilo-de-marquito-e-mais-45-para-investigar-rachadinha-22012020

quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

PROJETO INOVADOR NO MUNICÍPIO DE SUZANO PRETENDE OFERECER ATENDIMENTO ACOLHEDOR ÀS VÍTIMAS VULNERÁVEIS E CRIMES CONTRA OS ANIMAIS NO 2ª DP


As Advogadas Ariana Anari Gil e Jeaine Cristina Gil se uniram com o CONSEG Boa Vista do município de Suzano-SP presidido pelo Sr. Ebert Vicente Bola, com a finalidade de implantar no 2º DP do município atendimento de acolhimento às vítimas especialmente vulneráveis, mulheres, crianças, idosos, e também, os maus-tratos aos animais.

O Projeto visa a humanização e respeito ao ser vivo. O acolhimento, terá como premissa, orientação jurídica, saúde pública e resgate familiar, na junção de cuidado com o ser humano e ser não-humano, nas questões de extrema relevância social e jurídica.

Atualmente o Brasil concentra 139,3 milhões, de animais de estimação, de acordo com números levantados pelo IBGE, atualizados pela inteligência comercial do Instituto Pet Brasil, que contabilizaram no país no ano de 2018, 54,2 milhões de cães; 39,8 milhões de aves; 23,9 milhões de gatos; 19,1 milhões de peixes e 2,3 milhões de répteis e pequenos mamíferos.

Os números acima, comprovam que, vivemos em uma sociedade que cada dia mais convive com animais de estimação. O Brasil está, em formação das famílias multiespécies, que é aquela que reconhece seus animais de estimação como membro familiar, e assim, diante de novos costumes e comportamentos nasce a necessidade de garantir o direito do membro familiar pet, o atualmente reconhecido Direito dos Animais.

Destarte, não podemos ignorar que os seres não-humanos, em alguns aspectos, funcionam como indicativo para a sociedade, de que o comportamento humano precisa ser “tratado”, a fim, de coibir vários tipos de criminalidade, inclusive a criminalidade violenta, como a relação da violência doméstica com os maus-tratos aos animais, a conexão entre abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes com a zoofilia, a dependência química com a violência familiar que apresenta relação na violência ao ser humano e ser não-humano.

No ano de 2017 a advogada Ariana coordenou no município estatística da relação da violência doméstica com os maus-tratos aos animais, através da teoria de link, a qual, afirma-se que quando o ser humano é violento com o ser não-humano, no caso os animais, é também violento com o ser humano, caracteriza-se pelo ciclo da violência.

O resultado da estatística demonstrou a necessidade local de se debater o tema, vejamos:
  • 47% das vítimas de violência doméstica que afirmaram possuir animal de estimação em casa confirmaram a violência também com o animal de estimação.
  • 39% de todas vítimas de violência doméstica (independente de possuir animal de estimação), afirmaram ter presenciado atitudes violentas do parceiro com animais próprios ou de terceiros.
  • 20% das mulheres vítimas de violência doméstica que não possuíam animais de estimação, afirmaram a agressividade do parceiro com animais de terceiros.
Fonte:https://www.conjur.com.br/2019-out-04/opiniao-direito-animais-relacao-violencia-domestica

Outro ponto comum, da junção da criminalidade contra o ser humano e não-humano, é o estudo realizado pela advogada, que demonstra a conexão entre abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes com a zoofilia.

O abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes quando retratado pela perversão sexual ou parafilia (que é uma doença CID 10 classe F-65), poderá apresentar relação com a zoofilia (zoofilia: prazer em relação sexual com animai), atração ou envolvimento sexual de humanos com animais de outras espécies, sendo que, esse padrão de comportamento sexual, não está ligado diretamente ao ato sexual, ao prazer, mas sim, visualizar a vítima como objeto de desejo, falta de consentimento, vulnerabilidade, tais como, as crianças, os adolescentes e os animais.

Fonte:http://chatjuridico.blogspot.com/2018/05/a-conexao-do-abuso-e exploracao-sexual.html

Não menos importante, e noticiado quase que diariamente nos meios de comunicação, são os adultos que estão cometendo crime contra os animais, como os maus-tratos, na frente de crianças e adolescentes, ignorando que o ato, configura crime contra o animal e crime contra a criança e adolescente, além, no aspecto negativo na formação do ser humano, que presencia atos criminosos de seus responsáveis.
No mais, na atuação profissional as advogadas perceberam que lares e famílias estão se desfazendo, por problemas sociais que interfere na criminalidade, mas poderiam ser amenizados com humanização e políticas públicas eficazes, como o caso da dependência química. 

O fato pode ser constatado junto ao CONSEG Boa Vista no município de Suzano – SP, que tem desenvolvido trabalho aguerrido na localidade, no combate aos diversos tipos de criminalidade. 

Que, no dia 25 de Novembro do ano de 2019, a advogada ministrou palestra sobre o combate aos maus-tratos aos animais à convite do presidente Sr. Ebert Vicente Bola, no CONSEG Boa Vista, e pode observar que a dependência química, também, tem contribuído para a criminalidade face aos animais, vez que, munícipes relataram que por vezes “nóias” maltratam os animais dos seus lares ou em situação de abandono, bem como, maltratam seus familiares, destroem escolas, entre outras barbáries.

Vejamos as situações citadas acima, apresentam gravidade, a dependência química é considerada pela Organização Mundial de Saúde uma doença, que requer tratamento, porém, muitos ainda a consideram como “falta de caráter”, posicionamento grave, que atrasa o tratamento, e banaliza a conscientização como forma de prevenção. 

A dependência química segundo a OMS é uma doença de evolução própria, que pode levar à insanidade, prisão, morte, entre outros, se não tratada a tempo, porém, tem sido “problema” corriqueiro em nossa sociedade “cega”, para a gravidade da demanda.

Na infância e juventude, é perceptível pais e mães “perdendo” seus filhos, por vezes recém-nascido, para instituições de acolhimento ou parentes, porque a dependência química não lhe permitiu o discernimento da educação, sem contar, aqueles que nascem com patologias ligadas ao consumo de entorpecente durante a gestação, situação clara de saúde pública.

Jovens perdidos para a criminalidade, a fim, de sustentar o “vício”, presos por tráfico de drogas, quando na verdade a sua falta de percepção, o fez cometer crime, na utopia de que “apenas” estaria pagando pelo seu consumo, a situação é real e cruel, interfere na segurança e saúde pública, por um lado, não pode o Judiciário deixar de reprimir, a criminalidade na forma que a lei estabelece, muito menos podemos permitir utilizar-se do vício para cometer crime, por outro,  não podemos enquanto Sociedade, “fechar os olhos” para o colapso penitenciário que vivenciamos atualmente, cujo cenário culmina com a cooptação de jovens primários por facções criminosas, quando no seu ingresso no sistema, precisamos sim combater a criminalidade e recuperar nossos jovens, e, não abandoná-los a própria sorte do crime.

Outro ponto importante, é conscientizarmos a sociedade as várias formas de violência contra a mulher, inclusive a verbal, seres humanos machistas se utilizam do machismo discursivo, a fim, de calar a mulher na sua fala democrática, em busca da aplicação e efetividade de seus direitos.

Por todo o exposto, que no último dia 16, as advogadas Ariana Anari Gil, Jeaine Cristina Gil, o Presidente e o Secretário do CONSEG Boa Vista o Sr. Ebert Vicente Bola e o Sr. Carlos Jornalista, reuniram-se com o Delegado Dr. Jair da Secional, a fim, de dialogar, a possibilidade da implantação do núcleo integrado de atendimento no 2º DP, visando as necessidades locais, que vem sendo monitorada pelo CONSEG Boa Vista, em união aos déficits sociais apontados pelas advogadas e pelo delegado Dr. Jair, que com sua experiência e expertise lapidou a ideia.

Cabe esclarecer, que foi uma reunião preliminar, porém, dependemos da parte burocrática para a implantação.

Como diria Brigitte Bardot “Quando se é capaz de lutar por animais, também se é capaz de lutar por crianças ou idosos. Não há bons ou maus combates, existe somente o sofrimento dos mais fracos, que não podem se defender.”

Texto: Ariana Anari Gil
Imagem: Ebert Vicente Bola
Matéria anexa: Diário de Suzano.