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terça-feira, 23 de agosto de 2022

O Direito Desportivo, O Direito Animal e o Direito Médico-Veterinário

Com a volta dos Rodeios, Vaquejadas e similares pelo Brasil afora ao revés das decisões judiciais que quase diariamente tem proibido tais festas com exploração animal, cresce o debate acerca do Direito Desportivo, do Direito Animal e do Direito Médico-Veterinário. 

Afinal não é incomum a indagação se a proibição de tais "esportes", não afronta o desporto e a autonomia do Médico-Veterinário, que atesta a prática assegurar o bem-estar dos animais ? 

E a resposta é simples, primeiramente é preciso compreender o que é esporte na essência e segundo entendermos que a autonomia do profissional da medicina veterinária não é absoluta, vejamos:

Esporte em regra é definido como atividade física que visa equilibrar a saúde e/ou melhorar a aptidão física/mental do indivíduo, assegurado Constitucionalmente.

Contudo, as modalidades esportivas declinadas na literatura sobre o tema, consagram a realização do esporte/desporto com a utilização de OBJETO, bola, prancha, rede, e afins e NÃO VIDAS.

A Confederação dos Rodeios, Vaquejadas e similares, reconhecerem a prática como esportiva, é inconteste afronta ao DIREITO DO ANIMAL EM VIVER SEM SOFRIMENTO DESNECESSÁRIO, que nasceu da visão especista, arraigada e equivocada da nossa sociedade de que o homem "poderia" explorar o animal, para sua diversão.

Ocorre que, todo evento supra necessita ter um médico-veterinário responsável nos termos da Lei 10.519/2002 (dispõe sobre a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeio e dá outras providências.) que inclusive DEVERÁ impedir maus-tratos e injúrias de qualquer ordem aos animais expostos.

Art. 3o  Caberá à entidade promotora do rodeio, a suas expensas, prover:

II – médico veterinário habilitado, responsável pela garantia da boa condição física e sanitária dos animais e pelo cumprimento das normas disciplinadoras, impedindo maus tratos e injúrias de qualquer ordem;

Art. 4o  Os apetrechos técnicos utilizados nas montarias, bem como as características do arreamento, não poderão causar injúrias ou ferimentos aos animais e devem obedecer às normas estabelecidas pela entidade representativa do rodeio, seguindo as regras internacionalmente aceitas. (grifo nosso).

Logo, diversos cidadãos indagam, por quê alguns profissionais atestam o "bem-estar" dos animais envolvidos, ao revés de diversos laudos técnicos comprovando que provas praticadas em Rodeios, Vaquejadas e similares, causam maus-tratos e crueldade aos animais? E a resposta está no Código de Ética do Profissional, resolução 1138/2016 do Conselho Federal da Medicina Veterinária.

""JURAMENTO DO MÉDICO VETERINÁRIO Juro que, no exercício da Medicina Veterinária, cumprirei os dispositivos legais e normativos, respeitando o Código de Ética profissional buscando harmonia entre ciência e arte, aplicando meus conhecimentos para o desenvolvimento científico e tecnológico em benefício da saúde única e bem-estar dos animais, promovendo o desenvolvimento sustentável""

DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS 

Art. 1º Exercer a profissão com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade 

Art. 2º Denunciar às autoridades competentes qualquer forma de agressão aos animais e ao meio-ambiente 

Art. 3º Empenhar-se para melhorar as condições de bem-estar, saúde animal, humana, ambiental, e os padrões de serviços médicos veterinários. 

Art. 4º No exercício profissional, usar procedimentos humanitários preservando o bem-estar animal evitando sofrimento e dor.

Ou seja, é DEVER deontológico do profissional da Medicina Veterinária, denunciar qualquer prática de maus-tratos aos animais, como atuar buscando melhorias de bem-estar animal, logo, nessa perspectiva, em tese, afronta a ética profissional o médico-veterinário que permite a realização de provas de rodeio, vaquejada e similares que causem ferimento, maus-tratos, crueldade animal.

Pois, simples leitura das legislações supra, conclui-se que, havendo risco da prova causar ferimento ao animal exposto, e veja a legislação fala em ferimento, de modo genérico, independe se o ferimento é grave ou não, o médico-veterinário terá o DEVER de comunicar as autoridades responsáveis, não o fazendo estará agindo ao arrepio da ética profissional.

A meu ver, diante os estudos técnicos e científicos que decorrem os rodeios, vaquejadas e afins, ousaria dizer, que é praticamente IMPOSSÍVEL, o médico-veterinário sob o manto da sua autonomia profissional atestar que a prática não causará NENHUM ferimento ao animal, e se o profissional afirmar, e após verificar ferimento no animal exposto, em tese, o profissional incorrerá no crime de maus-tratos aos animais.

Diante do aludido, claro e evidente que a autonomia profissional do médico-veterinário não é absoluta, estando o mesmo obrigado a legislação de regência pertinente ao tema.

Havendo prova de que animais expostos sofreram ferimentos, o laudo do médico-veterinário atestando o “bem-estar” daquele animal, deverá ser contestado.

Frisa-se a Lei 10.519/2002 só permite o rodeio sem causar ferimento no animal exposto, logo falta fiscalização ostensiva, nos animais após exposição, vez que se tivéssemos, fiscalização minimamente satisfatória, dificilmente teríamos que conviver com a exploração animal.

Ademais, em tese a prática oferece risco não só aos animais expostos, como também ao próprio ser humano, tanto que a Lei 10.519/2002, exige a contratação de seguro de vida, e acidentes pessoais, aos peões adeptos, situação que por si só, afronta a função do desporto, que é promover melhorias à aptidão física e mental do indivíduo.

No mais, não se pode ignorar que a Constituição Federativa Brasileira VEDA a crueldade animal em seu artigo 225 inciso VII, como norma autônoma de proteção animal, além da Lei 9.605/98 tipificar em seu artigo 32 como crime ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos. Ou seja, o ato que causar ferimento ao animal, e mais uma vez repito, independe de grave ou não, é CRIME. 

Como se vê, não há na legislação em vigor, seja desportiva, animal ou direito médico-veterinário, justificativa para que animais sejam explorados, colocados em risco de sofrer ferimento, pelo ao contrário a legislação pátria PROTEGE o Direito de Viver dos animais, como afirmou a ministra Carmén Lúcia do Supremo Tribunal Federal "a aplicação dos princípios da prevenção e precaução devem se sobrepor à presunção legal de não lesividade dos apetrechos".

Para aqueles que queiram mais detalhes sobre a exploração animal que envolve os Rodeios, Vaquejas e similares indico a obra DIREITO ANIMAL: A TUTELA ÉTICO-JURÍDICA DOS SERES SENCIENTES da editora thoth




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